quinta-feira, 6 de dezembro de 2018



No fim, estamos todos sós.
Trancados em nossas salas escuras onde nada nem ninguém pode nos alcançar.
Nada além do sobrenatural que rege as coisas,
Nada além da inteligível mão que rege o universo.
E continuamos lá,
O grito preso na garganta, como um eco sem fim
ensurdecendo os sentidos
turvando qualquer caminho.
Nas salas escuras- de onde nunca devemos esquecer que pertencemos
A maior ilusão da vida
É acostumar-se com a luz
Se nosso sangue e alma são feitos de trevas
Nos habituamos à claridade do mundo
Chegamos a esquecer, até, de onde um dia viemos
Queimamos nossos olhos na luz irradiante
Pela vontade desesperada de brilhar
É aí, então, que nos são fechadas todas as janelas
Nos é tirado aquilo que nunca nos pertenceu
E somos, de volta, jogados no buraco da Alice
Uma queda profunda, brutal
Mas necessária
Para que nos lembremos
Daquilo que realmente é nosso
Pois somos cegos de nascença
Tateando a escuridão
Conhecendo os limites do mundo pela ponta dos dedos.
Somos nossos próprios guias
E a melhor forma de evitar as quedas é sermos cientes
de que não passamos de cegos.
Cegos sem voz.

Raízes

Depois de um tempo, aqui voltamos
Na tentativa de um mergulho profundo
De um ressonar nas entranhas
De encurvar-se em si mesmo
De olhar pra dentro

Escavar com as mãos
Até sangue, suor e sabor
Chegarem às raízes reviradas
E ali, enfim, fazer casa

Em gruta esquecida e profanada
Labirinto secreto
Onde por anos perdi as coordenadas
Mas que só eu sei o caminho

Hoje escavo com as mãos
Querendo me sujar inteira
De terra, de solo, de mim
- Quero o sabor da essência

Quero pendurar-me nas raízes
Docemente afagá-las
Enxugá-las com lágrima e pedir desculpas
Pelo abandono. Esquecimento. Desencontro

Por ignorar, por fingir
Por esconder, por ceder
Até a última gota
Até a última semelhança
Por me esvaziar de mim
De ti, que sou eu, e que há muito estava perdida
Porque hoje não sou tu
Mas quero ser
Pra ser inteira, pra ser imensa,
pra ser.